terça-feira, 22 de outubro de 2013

Cantata de Reza






Eclipse




Carne impura em impuras bocas saciando
Bebeste um gole de vinho com éter
Derramado em meu corpo de estrela
Enquanto calado mastigava tuas sementes

"Porque o impronunciável sabe que no dia
em que dele comerdes se abrirão os vossos olhos,
e sereis como ele, sabendo o bem e o mal."¹

Dentes de mármore, corpo de rubi, olhos de serpente
Em minhas pupilas dilatadas surgiste como o horizonte
escondida sob o manto cristalino e perfumado da noite
e te persigo sem fins e sem meios, és senão o começo.


"Os filhos de minha mãe indignaram-se contra mim,

puseram-me por guarda das vinhas; a minha vinha, porém, não guardei...

E a minha boca como o bom vinho para o meu amado,
que se bebe suavemente, e faz com que falem os lábios dos que dormem."²

Palpitavas serenamente meu membro vazio
fugiste como uma lebre ferida de costas para mim
Disseste algo antes de ir, entendi que somos incomunicáveis

"Assim diz o impronunciável:
Eis que eu suscitarei contra ti os teus amantes,
dos quais se tinha apartado a tua alma,
e os trarei contra ti de toda a parte até a tua derrota."³

Me abateu como um cervo e ferveu-me em óleo e em bálsamo
Mastigastes minhas carnes com sua boca impura e senil
Somos um só deitados em nossas peles entre o abismo e o céu

"E a mulher estava vestida de púrpura e de escarlate;...
e tinha na sua mão um cálice de ouro cheio das abominações
e da imundícia da sua fornicação;
E na sua testa estava escrito o nome: Mistério...
E vi que a mulher estava embriagada do meu sangue,
e do sangue das testemunhas do Impronunciável.
E, vendo-a eu, maravilhei-me com grande admiração."



1:Gênesis 3
2:Cânticos 1 e Cânticos 7
3: Ezequiel 23
Apocalipse 17 


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Soneto de Prece


A prece que sussurra nos lábios calados cai como orvalho pelos olhos
mãos que passeiam no vento e aquecem a pele de nossos irmãos
pois cheirando enxergamos muitos além da pedra angular do existir
e em círculos nossa comunhão se completa na doação, no sofrimento.


Me dê a mão e me guie nos caminhos como te guiarei nas galáxias
sejamos um só e nossa voz se fará presente no cantar dos passarinhos
pois o abraço, mesmo que seja na mais profunda solidão, está além da união
está no inimaginável bater de asas das borboletas e no girar de uma estrela.


O conforto não existe, somos a transformação que nos rodeia 
Uma estrela de neutrôns em cada coração que pulsa, em cada joelho que dói.
Há um universo dentro nós e nele há um caleidoscópio de universos...


Apenas sinta sua pulsação em comunhão com a brisa que balança as folhagens
Verás que já nascemos eternos e estamos em total sintonia com o existir 
porque nossa vida jamais será conforto, ela foi, é, e sempre será uma prece.



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Ponderação Primeira

Um pouco de mim ficou pelo caminho
Um pouco do caminho ficou em mim
Recito estes versos para as pedras
e as pedras repetem para o vento

Faça da vida uma aurora dourada
e nuvens negras te cobrirão o céu
Repouse tua dor na relva molhada
e serás relva e serás água.

Canto sereno na chuva
Descanso os olhos no céu
não há céu e não há chuva

_é tudo_

A ilusão serena do existir
agora as pedras cantam
nos muros que construo em mim



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Lilith cavalgando Nandi 
.
..
...
Teu corpo é minha religião
Entoada em cada alegre pranto
Em cada beijo uma reza velada
Confessada entre tuas pernas

...Nas tuas nádegas amaldiçoadas...

Te criei com a costela de meu Deus
Dei-te vida nos meus lençóis suados
Agora és a serpente no meu Éden
E és meu pecado mais sagrado

...Teu fruto brota em meu barro...

A oração entoada em tuas carnes trêmulas
Santifica meu servir em tuas coxas arrepiadas
Ao cabo, sou a estrela da manhã que te glorifica
No inferno celestial que brota pelos poros

...O mais profundo abismo em elevação....

O suplício rasgando minhas entranhas em dor perene
É o mesmo que em gôzo constrói seu paraíso
Teu corpo na penumbra me confunde, pois
Nada permanece igual quando olhado duas vezes

.....................................................

"Incinere-a e levante o pó às estrelas,
Para que a Lua possa ser meu firmamento mais brilhante.
...
Traga-me as chaves que abrem as arcas
que abrigam os tesouros da Terra,
E permita-me glorificá-la no púlpito de minha cama."

.... 


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Quem não sabe voar


Em um instante tudo parou e houve silêncio
o céu nublado nos olhos não permitia expressão
Nos lábios se formava um plácido lago de águas turvas que silenciava
as mãos padeciam imóveis sobre as pernas que balançavam

Do sentido primordial que supunha nada restou de concreto
cogitava abraçar...beijar...tocar...transar...mas há descrença
naquele instante todas as limitações fluíram na ideia de si em si
conhecendo seu próprio desconhecimento se fez desonesto.

O oceano alheio no momento de vazio igualmente evapora
palavras doces na boca de quem sorri são mentiras de seda
a admiração é somente a inveja multiplicada à sua potência

Um vento leve cantou nos ouvidos apertando os olhos no sol
levantou com toda a calma que poderia extrair do seu íntimo
sorriu levemente ...
sempre soube que quem caminha se eleva aos demais


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animam misera


Nesse dia de todos os dias
Os joelhos amanheceram doloridos
e a manhã parece de um cinza colorido
Todos os seus vícios parecem te consumir...

A vida beira a miséria da própria existência
E a consciência é eterea na sua solidez
Uma fada se ajoelha nos ombros
Um demônio beija seus pés

Uma figura disforme materializa sua visão
Não é ciente da condição da materialidade
Mas como árvore, nasce sem censura

Seria outra pessoa que não a sua? Um arlequim?
Nada é certo, como o vento, como a água...
A visão é sua, os pesadelos, os sonhos...

A visão era si, em si ...

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Ode escrita em uma concha de Madrepérola


Serpenteavas em meus cabelos bagunçados
como lacraia sorrateira se alimentando de mim
me diga Vênus dos olhos de ameixa
o que é pior
ter você em meus braços se alimentando do meu espiríto
ou ver você em braços alheios me alimentando com isso
?
Teu corpo crú roçando em meu ego não seria bom
seria imundo se não fosse essa coceira no olho
me diga Afrodite da caverna
o que é pior
meu existir em sua carne fraca e doce como uva
ou sua existência em meus modos duros e desavisados
?
Um tapa na mosca que me incomoda no nariz do Machado*
A mosca, ela mesma, é eu _Belial_ pousado no teu seio
me diga Citereia do corpo dourado
o que é pior
Ser a própria flexão de tudo aquilo que sonho em sua pele
ou ser o próprio sonho tendo você flexionada sobre mim
?




*Machado de Assis, "Memórias Póstumas de Brás Cubas", Capítulo XLIX.
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Dom Quixote

Surgiu no horizonte choroso
Cavalgando Têmis sem rédeas,
Em sua frente um imensa figura,
era Osíris segurando um dragão.

Sua armadura de cristal reluzia,
No punho carregava uma lança de prata
e um punhal de marfim no coração,
Soluçava mas permanecia impávido.

Osíris soltou a besta-fera e como Jorge*
Desferia golpes desesperados na imagem,
Tinha medo mas não sairia sem destruí-la.

Pronto, já não havia mais dragão ardente,
ajoelhou-se e viu suas mãos sangrando...
Lágrimas quentes caiam no espelho quebrado.


*Referência à São Jorge.
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A semente.



Na minha testa está marcado YHVH
No meu braço direito carrego An
No braço esquerdo penduro Arimã
Em meu ventre nasce  Ometeotl.
Sob meus pés guardo Seth

Meu corpo de ébano está aberto a ti senhora
faça de mim seu instrumento e sua vontade
que as galáxias suspirem sobre nós
e que a noite não se mova

Foste minha fome mais poderosa, meu ódio mais profundo, meu amor mais débil.
Padeço apartado da Moral e unido aos impronunciáveis que estão além do Bem e do Mal. 
"A Vida do Homem é apenas um jogo de criança cheio de idiomas estranhos."¹

Já disse o tranformador que "o que está embaixo é semelhante ao que está em cima e o que está em cima é semelhante ao que está embaixo."² Somos um só rainha, caça e caçador.
Me nega o alivio de tuas pernas, para que da prata e do cobre sejamos ouro. 

Na árvore da união, mastigo-lhe fruto
E você me cospe semente 
enquanto me desfruta
eu te creio. 




1 - Liber vel Daemon 2.
2 -Tábua da Esmeralda


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Minha amiga


Da vida o que temos é o sagrado
amarrado a leve beleza de ser
que essa brisa no olhar trás...



Nossa materialidade nada é,
nos somos o verbo em carnes
e somos o dedo do Impronunciável.
"O que era desde o princípio, o que ouvimos,
o que vimos com nossos olhos,
o que contemplamos e as nossas mãos apalparam."

Somos o que foi, o que é e o que será

Viver é dançar sobre o infinito de ser
é beber da água sagrada que molha a face
sentir a chuva, o céu, o vento, a sombra amarga,
sentir o amor que emana de nossos irmãos,

pois, "quem afirma estar na luz mas odeia seu irmão,
continua nas trevas", e é o escuro que passeia nas trevas;
não sabe para onde vai e de onde veio, porque está cego.

Permaneça desperta...

A vida é nascer e renascer, é semente antes de fruto
é crer no impossível como o pai e no possível como mãe
somos a figueira que dá sombra ao criador
e somos a grama que o Impronunciável se deita.

Somos o fim e o princípio que assim falou:
Eu sou o Verbo, e o eu sou Impronunciável
Fui antes do tempo, e sou o próprio tempo.

Somos o Espírito dele que se movia sobre a face das águas
quando Nele estava a vida que nos iluminou,
agora somos sua luz.
Resplandecemos nas trevas, sem ela nos compreender.
Somos as trevas e somos a luz.

Vê, a vida é verbo, é o sagrado, é o tempo determinado,
somos "o tempo para todo o propósito debaixo do céu."
pois somos o próprio céu que semeia vida
e somos a própria vida que semeou o céu.



Ouvidor 05 Novembro de 2013

1 João: 1
1 João: 9, 11
Evangelho de João 1
Gênesis 1:2
Eclesiastes 3:1


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A encruzilhada


Havia uma árvore frondosa de galhos mansos na encruzilhada
ajoelhado proferiu uma prece dolorosa aos seus pés
dois pássaros cantavam em seus galhos:
um entoava a canção da fortuna
o outro o hino da miséria...

Duas contas de cristal saltaram dos olhos
e permaneceram sobre a terra
o vento sul gelado era seu companheiro
a árvore?
docemente dançava com o vento
a dança fúnebre da amargura

Sob aquele sol escaldante
A árvore morria
os pássaros se devoravam
seu rosto mutilado tinha gosto bom
Era ele agora o Urubu que roía as próprias entranhas

Ao mastigar suas carnes os céus nublaram

O Nephilins cantaram ao assistir aquela cena:

"Ó Tu, o mais sábio dos Anjos e o mais belo!
Ó Enlil traído pela sorte,
não abandones teu desejo!
Príncipe do desterro,
com quem o Impronunciável foi injusto,
altivo sempre venceste,
ergue-te então mais robusto!"

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Pecador


Nasceu uma imensa amoreira
Na sombra que eu fazia sobre mim
em seu tronco jazia um ente
ouvia-se, mas não se via

Aquela árvore nascia em um mundo estranho

um mundo cerceado de glórias
um mundo de nuvens carregadas
um mundo em que só a relva era molhada

[de dentro da amoreira gritava
rangia os dentes e calava]

Em seu íntimo queria colher amoras
mas cadê? Não havia amoras
havia galhos e nos galhos nada
então começou a cantar
e de dentro do tronco
ouvia-se:

"Oh sinnerman, where you gonna run to?
Sinnerman, where you gonna run to?
Where you gonna run to?
All on that day"

de pés juntos e mãos no peito
dentro do tronco morto aquela prece
aquela comunhão persistia:

"But the lord said, "go to the devil"
The lord said, "go to the devil"
He said, "go to the devil"
All on that day

So i ran to the devil, he was waitin'
I ran to the devil, he was waitin'
Ran to the devil, he was waitin'
All on that day"¹



Elenilton da Cunha Galvão
Ouvidor 16/12/2013



1- Trechos da música popular Sinnerman.


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Hino de saudade




Pedi um poema de recordação
Mnemosine entregou-me um de esquecimento


Fiz um cordel das lembranças

E o vento cantou sua imagem:

...

"O que for da profundeza do teu ser, assim será teu desejo.
O que for do teu desejo, assim será tua vontade.
O que for da tua vontade, assim serão teus atos.
O que forem teus atos, assim será teu destino"¹

...

Agarrei-me àquelas memorias serenas
e teu rosto parecia uma tarde fresca

Como um cervo triste me agarrei em teu ser
e em tua devoção teci esta prece:

...
Deusa imortal, do tronco de cores brilhantes
filha do universo, tecelã da primavera, eu te suplico
não me submetas a dores e tormentos.

Rainha, em meu pesar seja plácida como um lago
e quando ouvires ao longe meu sorrir ou meu chorar
me atendas e deixe teu pai em seu palácio dourado,
venha até mim com sua carruagem de faisões prateados

Em teu pouso traga um sorriso em seu rosto imortal

e quando chegares

Não me perguntes do meu sofrer
pois minha súplica é de desejo
como corações cor de carmim
como mãos de mármore unidas

Deusa banhada com o sangue de Kamadeva
Tua distância me destroça como Helgardh
e minhas lembranças te perseguem
e me torturam como a lança de Ares

Se o presente não aceita, te aceitará
Se não ama, em breve amará

Venha até mim agora, e liberta-me
dessas penosas inquietações
realiza tudo o que desejas realizar
e tu seja minha prisão e minha liberdade
...

1- Vedas
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Hino a minha pequena


Se houver nuvens sobre nós
E as estrelas como flocos de neve caírem
Em meus guardados sentirei sua presença
Como uma brisa fresca

Pois sentado do alto da montanha houve um sábio que nos disse:

“Quando o seu olhar tiver se tornado forte o bastante para ver o fundo,
 Na escura fonte de seu ser e de seus conhecimentos,
Talvez também se tornem visíveis para você,
No espelho dele, as distantes constelações das eras vindouras. ”¹

Agora não há era e nem tempo
Pois sentindo este minuano nas faces
Minha alma é um condor de asas prateadas
E meus olhos são dois imensos oceanos.

Nossa mãe, minha pequena, repousou sua mão sobre nós e nos abençoou:

“Eu sou a filha de Atlas e de Sjofn.
 Eu estou sombreada com o Círculo das Estrelas
 E coberto com as nuvens da Aurora Dourada...
 Felizes são aqueles que se unem em carne
Pois, as noites serão doces,
e os dias, cheios de prazer.”

Quando as tempestades chegarem
Sentiremos o vento fresco
E quando nossos castelos se erguerem
Nossa visão alçará além de nossas almas

E assim foi dito pelos meus protetores quando lhe repousaram as mãos:

“Ponha-o como selo sobre o teu coração,
E como selo sobre o teu braço,
Pois o amor é forte como a morte,
...
As suas brasas são puro fogo,
São persistentes labaredas.
As tempestades não podem apagá-lo,
Nem os rios afogá-lo,
Ainda que alguém desse todos os seus bens
Em troca desse sentir, nada receberá senão desprezo.”²

Os dias virão como uma revoada de cisnes minha pequena
E tú permanecerá em mim como uma frondosa cerejeira
E eu serei tua pilar e tua almofada em noites de outono
Pois o senhor do tempo nos guarda em uma profunda mansidão.

E com uma voz mansa o profeta ao nos ver sob o luar disse:

“Quando o amor vos chamar, segui-o,
Embora seus caminhos sejam agrestes e escarpados;
E quando ele vos envolver com suas asas, cedei-lhe,
Embora a espada oculta na sua plumagem possa ferir-vos;
E quando ele vos falar, acreditai nele,
Embora sua voz possa despedaçar vossos sonhos
Como o vento devasta o jardim.

Pois, da mesma forma que o amor vos coroa, assim ele vos crucifica.
E da mesma forma que contribui para vosso crescimento, trabalha para vossa poda.

Como feixes de trigo, ele vos aperta junto ao seu coração.
Ele vos debulha para expor vossa nudez.
Ele vos peneira para libertar-vos das palhas.
Ele vos mói até a extrema brancura.
Ele vos amassa até que vos torneis maleáveis.
Então, ele vos leva ao fogo sagrado
E vos transforma no pão místico do banquete divino.”³



1 - Nietzsche
2 - Cantares de Salomão 8:6
3 – Khalil Gibran
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Estrela Vinagre

Brotam Oleandros no desconhecido
Poucos crescem
Mastigados pelo hálito de Moros,
Cuspidos na terra seca

Há caminhos que só se diz em silêncio
E que só percorremos parados
Há sempre mil razões iguais
Para uma razão diferente

O sol místico é suportável
Na pele do
Deus pagão dos Vinhos acres
Estrela vinagre

Os defeitos é o que de melhor possui
Toda qualidade é em si um problema
Veja, na aridez nasce o essencial
E na essência o desnecessário

Aquela nuvem de gafanhotos negros
Sem asas nem olhos
Cobre a vetusta Estrela da Manhã
Sem pontas nem rumo

No deserto feito de si consciência
O inconsciente floresceu como cactos
A sabedoria frutificada da ignorância
Faz infeliz aquele que nunca sofreu.
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Maternitate 







Asas que lamentam nos olhos
em revoadas alçam o céu

Em meu sentir brota uma frondosa Sucupira,
suas raízes tocam as trevas

Essas sementes em minhas mãos são pedras,
mortas assim germinam erva, capim.

Quando nasce esperança e melancolia em planta
ao secar embriona-se em animal, besta fera.

Sangra o cordão umbilical que faz da Terra colóide,
e de seu barro macerado dá forma ao homem. 

Porque tens medo?
A morte é ressurreição, esquecimento, renascimento e lembrança.
É a filha escravizada das Moiras
que tecem o fio da vida
com as tranças de seus cabelos

Assoviando essa canção maldita
mal posso lhe escutar 
És fogo de douradas labaredas
me consuma 
pássaro caolho

Este caminho
Ninguém percorre
quando anoitece.

Sinto o perfume 
de flores de mármore
mas não vejo 
não sei de onde vem

Profanei o leito de Nêmesis 
Transei com sua espada cravada em meus intestinos.

Busco a vida no sangue que derramo em Saturno
e eu a encontro descendo a sua rua com belos olhos de chumbo.

Motivado pela grande fome
eu mastigo minhas mãos
só para sonhar que tuas carnes fétidas
são como testículos arrancados por Lilith

Belial sussurra ao meu ouvido
E nos olhos da morte confessei:

Quão belos são os teus pés
no pisar que trazes
ó filha do príncipe!
As colunas das tuas pernas são como anéis
trabalhados pelas mãos de Miguel da toscana.
O teu ventre é uma falésia que não erode ,
e teus lábios é como o cântaro
que nunca está sem o amargo vinho.
Os teus cabelos são como campos de tulipa 
e tuas mãos é a brisa do outono que os balança.
Os teus seios são como os Andes,
E tuas palavras senhora
são as grades da minha gaiola.

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Dança cósmica 

Na boca pedregosa 
o tato do javali parece um afago
entre os dentes
a dor daquele defunto é um alivio


seu prazer, foi seu suplicio


Agora a loucura está presente 
a lucidez, esse mal, te fez pior
A besta das sete lâminas
há pouco fazia mimos em Pandora 

Belial desperta como uma dama
seu hálito é primavera e tempestade
suas palavras tem gosto de carne
as minhas são pústulas no ego 

sete estacas no tórax
sete dores na (--------------------)
era grosso teu vinho mulher
em tuas coxas que a deusa habitava
agora nasce erva e veneno

Não me pergunto mais, não supor é a resposta
sentir Hemingway conversando ao pé do ouvido
faz subir aquele quarto crescente no seio
Talvez seja a lua negra, ou o delírio

Cala-te maldito
deixe a estrela da aurora subir mais alto no céu
porque calado consigo gritar 
gritar o silencio mais profundo

Dos platôs de Sírius 
aqueles de Serpo 
como golfinhos estridentes 
gritaram no desfiladeiro do desespero
"filha de Gaia 
a vida é ilusão
o existir, na verdade
é inexistir
ela própria 
é o morrer
e nós
mais
absoluto
vazio"






Elenilton da Cunha Galvão